O conceito de que o Brasil exporta apenas seu melhor café enquanto consome uma qualidade inferior tem raízes históricas, porém, transformações na indústria e regulamentações recentes estão ajudando a mudar essa percepção. Durante a década de 1980, a baixa qualidade do café consumido internamente era predominante, resultado de um controle governamental de preços que desincentivava a busca pela excelência e encorajava fraudes, como a mistura de cevada e milho aos grãos.
Um Passado de Regulação Fraca
Nos anos 1980, o governo brasileiro, na tentativa de controlar a inflação, mantinha controle rígido sobre os preços do café, segundo relata um artigo do Inmetro de 1998. Essa política debilitava a qualidade, pois os melhores grãos eram destinados à exportação, atraídos por preços mais altos no mercado externo. A imagem negativa do café brasileiro entre os consumidores locais levou a um declínio significativo no consumo, que caiu de 4,8 kg por pessoa em 1965 para 2,27 kg em 1989.
Foi apenas a partir de 1989, com a supressão do Instituto Brasileiro do Café (IBC) e a transferência do controle de qualidade para a Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), que a mudança começou a ocorrer. Sob a nova gestão, a Abic introduziu o Selo de Pureza, incentivando as empresas a produzirem pacotes de café com 100% de grãos de qualidade.
Avanços na Qualidade e na Reputação
Peças publicitárias, incluindo aquelas com o renomado ator Tarcísio Meira, tiveram um papel crucial na melhoria da imagem do café nacional. Veiculadas durante anos, essas campanhas ajudaram a restaurar o prestígio do café brasileiro, destacando as melhorias em sua produção e pureza.
A partir de 2022, novas regulamentações do Ministério da Agricultura estabeleceram padrões stricots para o café torrado no Brasil, limitando impurezas a menos de 1% nos pacotes. Essas medidas são parte de um esforço contínuo para garantir a qualidade do produto e eliminar marcas de “café fake”.
O Café Especial e o Mercado Internacional
Apesar das melhorias, o café especial – caracterizado por grãos 100% maduros e sem defeitos – ainda é majoritariamente exportado. Embora o consumo doméstico deste tipo de café tenha aumentado de 1% para 15% nos últimos anos, ele permanece mais popular fora do Brasil.
A tarifação recente de Donald Trump sobre produtos brasileiros, que inclui café, levantou questões sobre o acesso ao café de alta qualidade no mercado interno. No entanto, a complexidade comercial e a natureza do mercado global de café tornam improvável que uma simples barreira tarifária reverta instantaneamente o padrão histórico de exportação de grãos premium.
Conclusão
O café brasileiro está, sem dúvida, em um caminho de qualidade ascendente, resultado de décadas de reformas e inovações na regulamentação e no marketing. A história do café no Brasil é um exemplo do impacto duradouro das políticas econômicas internas e externas. Com o contínuo aumento do consumo interno de café especial, fica mais claro que o Brasil não apenas exporta sua melhor produção, mas também está no caminho de apreciar sua riqueza internamente, cada vez mais.